Memória de dias atrás

Eu estive dançando noite passada com o meu eu. Eu estive bebendo mais do que eu se deve beber em uma noite. Eu estive falando sobre coisas que me mutilam ao invés de ficar em silêncio. Eu estive sofrendo por dores que já não doem mais só pelo prazer de me me ver sangrar. Eu estive forjando um novo nome para fugir de mim mesmo quando o dia clarear novamente. Eu estive fazendo muitas coisas e nenhuma delas trouxe de volta a paz que eu perdi nesses anos miseráveis.

Memória de natureza

A natureza humana é embasada em esquivar-se da culpa, do compromisso, da realidade e da própria humanidade. A natureza humana é de baixa densidade e de fácil dispersão... os medos, as dúvidas e os arrependimentos nos levam ao largo caminho do abismo onde os deuses nos esperam para dizer o último adeus. Quando fora da prisão material, quando fora do corpo frágil e miserável ainda temos nossos espíritos corrompidos. Há muito mais vermes e parasitas em nossas almas do que em nossos corpos sepultados. Há muito mais dor e desespero em nosso coma kármico do que em nossas feridas abertas que transbordam sangue. Surge sempre em meio ao caos a personificação do horror e do desespero enquanto tentamos nos abastecer com verdades amenas sobre a causa e o efeito de uma existência que se pressupõe consciente. Há ainda uma particularidade maior sobre todas essas coisas que envolvem nossa natureza: estamos destinados ao infinito ciclo da dor.

Memória de deus

Eu sou um deus triste por estar sempre só.
Eu sou um deus triste por ter doado a minha alma ao mundo
e ter permitido que ele vivesse sem mim.
Embora lembre meus muitos nomes e peça misericórdia, o mundo vive sem mim.

Eu sou um deus triste por não poder salvar este mundo.
Eu sou um deus triste por não poder salvar a minha própria alma
e por deixar que o mundo use-a como sopro de vida descartável.

Eu sou um deus triste por ser tão humano.

Memória de tudo

Todas as pessoas são como folhas secas esperando por seu próprio incêndio.
Todas as sombras engolem a vitalidade das existências.
Todos os amores caem mortos e não podem ser levantados.
Todos os dedos sangram agora e não tocaram em nada que seja puro.
Todas as luzes estão apagadas.

Memória de perdão

Eu queimei a memória, as mãos e os abraços. Eu rasguei os sorrisos e zombei da dor.
Eu sou quem anda só, pisando em cinzas e sustentando o medo. Eu sou a matéria gasta e o horror dos anos, espalhados em meio ao sofrimento.
Eu sou quem está de joelhos pedindo perdão por nossos pecados ao deus da bondade; caído atrás da porta.